16 de jun. de 2010

Reflexão Infantil

Lembro-me do sorriso no reflexo d´água, ainda que conturbado pelas ondas do chacoalhar do balde. O quintal escorregadio de sabão, a mangueira aberta, o sol de outono amarelo e vermelho mesclado com a névoa da lembrança.

No corpo só a cueca. Vergonha menino não tem. Nem porquê de ter havia. Não se tem vergonha do que não se sabe. E eu só pensava que sabia.

Os passantes se apressavam, não queriam molhar os pés. Afinal, água da calçada faz mal - minha mãe sempre dizia, e diz ainda por sinal.

Dona bonita vem se apressando. Poc, poc, salto alto, onça no pescoço, pressa de chegar a algum lugar. Por detrás da grade da varanda observo como ela anda. Ri-me! Engraçado! Tanta frescura! Quem será que ela quer enganar?

Minha mãe continua a esfregar o alpendre, absorta em seus afazeres. Já era tarde, logo anoiteceria. Eu olho pra ela, nada a distrai. Volto a olhar a dona passante. O comichão começa a brotar de fazer algo que não deveria.

Disfarçado pego a mangueira, caminho até a calçada. Num rápido movimento do esguicho miro e acerto no bicho - deixo a onça molhada! A dona então esbraveja: "Qué isso menino! Tá louco? Me molhando sem motivo?"

Motivos tinha de sobra! Ela apenas não sabia, e nem queria saber. Nessas horas minha mãe entra no assunto vermelha de vergonha pela cria mal-educada, pedindo desculpas por mim, dizendo: "Foi sem querer!"

Se torcendo de raiva a mulher continua a caminhar. Se foi pra não sei onde, espero nunca saber. Minha mãe então pergunta: "O que aconteceu, meu filho? Por que fez esta barbaridade?" Inocente, sem saber das consequências, respondo sinceramente: "Não sei, só me deu vontade!"

 

Ricardo Pessica

Nenhum comentário:

Postar um comentário